segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

ATÉ A PÉ CHORAREMOS.

Por Andreas Müller

Está oficialmente decretado o Estado de Chororô na República da Azenha.
Preparem os lenços, mangas de camisa e caixinhas de Kleenex: todo esforço será pouco para conter o tsunami de lágrimas deflagrado pelos gremistas em Erechim. A Defesa Civil já prevê afogamentos e mortes por desidratação. No centro do país, órgãos de imprensa, artistas e atores de Rede Globo prometem uma megacampanha de solidariedade em prol da nação tricolor. Aliás, o primeiro avião com mantimentos já pousou no Aeroporto Salgado Filho nesta manhã. Trazia 100 toneladas de Lexotan, 250 mil sachês de água-com-açúcar e quase três mil engradados de cerveja – “para que afoguem suas mágoas”, explicou o comandante da operação.

Lula fez um pronunciamento de última hora em cadeia nacional. Referindo-se à República da Azenha, foi enfático: “Nunca antes na história daquele país se viu tamanho chororô”. Generoso, o presidente prometeu incluir nas obras do PAC a reconstrução da autoestima tricolor. Mas fez uma ressalva: não será nada fácil. Afinal, depois de quase uma década sendo bombardeada incessantemente pelos sucessos do Internacional, a República da Azenha está em pandarecos. O estádio, por exemplo, será dado a uma tal de OAS – que é uma espécie de FMI da nação azenhense. Já as reservas internacionais de títulos estão quase esgotadas, muitas delas com o prazo de validade vencido. A boa notícia é que a República da Azenha conseguiu, ao menos, conter a fuga de capitais: desde 2006, quando se livrou das agruras da Segunda Divisão, só foge das capitais em partidas válidas pelo Gauchão.

Os meteorologistas ainda buscam explicações para o fenômeno que desencadeou o chororô gremista. Depois de muitos cálculos, simulações e consultas ao babalorixá Paulo Sant’Anna, chegaram a uma conclusão bombástica: foram eles, os dirigentes do Grêmio, os grandes responsáveis por transformar a República da Azenha em um vale de lágrimas.

Celso Roth, por exemplo, passou a semana inteira afirmando que o Grêmio quer a Libertadores, que o Grêmio respira a Libertadores, que o Grêmio deseja ardentemente a Libertadores, que o Grêmio manda flores, escreve bilhetes, ensaia serenatas e espera debaixo da chuva só para ver a Libertadores aparecer na janela. Em condições normais de temperatura e pressão, essas declarações de Roth teriam um claro significado: o Grêmio não estava nem aí para o Gre-Nal. Poderia até perdê-lo – como sempre – que ficaria numa boa, não ia doer nada. Mas bastou a partida terminar em Erechim para que todo o discurso de desprezo ao Gre-Nal fosse pelo ralo. As reclamações exageradas contra Carlos Simon, a choradeira na análise da partida, a necessidade de autoafirmação, como quem se olha no espelho e repete: “nós fomos melhores! Perdemos, mas fomos melhores!” – tudo isso apenas denuncia o óbvio: a República da Azenha não aguenta, simplesmente não suporta mais perder Gre-Nais.

O fenômeno poderia ter parado aí, mas adquiriu contornos de tragédia quando Duda Kroeff assaltou os microfones das rádios com um ultimato: caso os problemas de arbitragem continuem acontecendo, o Grêmio vai “largar o Gauchão” e jogá-lo somente com reservas. Vejam a mágoa, a dor estampada em cada palavra do presidente da República da Azenha! Quer dizer que o Grêmio copeiro e peleador, multicampeão e dono da torcida mais vibrante, guerreira e original da Via Láctea não é capaz de suportar os inconvenientes de uma arbitragem atrapalhada? Quanto chororô, francamente!

O engraçado é que o Grêmio quer ser tricampeão da América em 2009... Mas bastou enfrentar o primeiro contratempo do ano para que seu presidente viesse a público dizer, com beiço e lágrimas nos olhos: “Não brinco mais!”. Fico até pensando, cá com minhas abotoaduras: e se Kroeff fosse presidente do Inter em 2005? Seria, no mínimo, interessante. O Inter reverteria o canetaço de Luís Zveiter e anularia o histórico pênalti não-marcado sobre Tinga, tudo isso de uma forma simples e inovadora: nós “largaríamos” não só o Gauchão, mas o Brasileiro, a CBF, o Clube dos 13, a Conmebol, a Fifa e talvez o próprio futebol. Tchanã! Teríamos aí uma desistência à altura de todas as injustiças que cometeram contra nós naquele ano.

Genial, não?

Sejamos justos: reclamar é um direito de todos. Mas daí a protagonizar essa épica choradeira vai um salto enorme. Carlos Simon errou, sim. Mas errou em lances capitais para ambos os lados. De resto, não foi Simon que determinou que as inúmeras chances do Grêmio acabassem na linha de fundo ou na trave. Não foi Simon que colocou aquele chute solitário de Nilmar na gaveta de Vitor. Não foi Simon que manteve o Grêmio invariavelmente na condição de freguês do Inter por quase toda esta década.

A dor da derrota é indisfarçável e só há uma maneira de atenuá-la: reconhecendo que ela dói. Roth e Kroeff sairiam muito melhor da derrota deste domingo se simplesmente adotassem uma postura mais digna e assumissem suas falhas. Mas não: em vez disso, preferiram submergir a República da Azenha em lágrimas mornas e graúdas, daquelas capazes de fazer inveja ao mais sofrido torcedor do Botafogo. O pobre Botafogo, que depois de ter se consagrado como o “clube do chororô” parece ter encontrado um rival à altura. Um rival que já chega com uma vantagem: seu chororô é especial – é um chororô imortal.

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