sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

OPORTUNIDADES.

Por Thiago Marimon

"Treinar para que, se eu já sei o que fazer?!" Esta frase é do baixinho Romário. Na verdade dizem que é dele, tal qual atribuem crônicas das mais diversas a Luis Fernando Veríssimo. Uma dessas crônicas mais conhecidas que circula pela internet, atribuída à Veríssimo, chama-se "Quase", e, embora o título sugira, não se trata de uma crônica sobre um time qualquer de Porto Alegre que há anos não ganha nada e comemora os seus "quase títulos". A crônica "Quase", de autoria de Sarah Westphal, versa, entre outras coisas sobre oportunidades. A forma como elas surgem e passam, são aproveitadas ou escorrem por entre os dedos. Trata do que poderia ser e não foi. Dos momentos que surgem diariamente e que tem o condão de mudar o rumo de nossas vidas, mas que, na maioria das vezes, sequer notamos. Ou pior, percebemos que estamos diante de uma grande oportunidade de mudar algo, mas por covardia, acomodação ou inércia/preguiça, apenas contemplamos a chance, pedindo aos deuses que um dia nos concedam o privilégio de ter outra oportunidade daquelas. É mais fácil, mais cômodo e tranqüilo o sonho. Agir são outros quinhentos. Na prática, a teoria é outra.

O ano é 2007. O Celeiro de Ases acaba de parir sua nova promessa. Surge para o futebol profissional, já devidamente aliciado, digo, empresariado, um garoto de cabelo black-power, o qual atende pelo nome de Roger. Em seu primeiro embarque junto aos profissionais o garoto se atrasa e perde o ônibus que partiria rumo à pré-temporada em Bento. A diretoria, seguindo sua cartilha linha-dura, prontamente o devolve as categorias de base, postergando sua ascensão por mais um tempo, como forma de dar uma lição no garoto. Os críticos diziam, consternados, que desta forma, ao punir-se o jovem jogador, punia-se também o Clube, que não poderia contar com sua mais nova promessa. A oportunidade sonhada por nove em cada dez guris surgira para Roger. A chance de tornar-se um jogador de futebol profissional. Fama, reconhecimento, dinheiro e demais prazeres da carne. Roger, não percebeu sua deixa. E se percebeu, não a aproveitou. Tentou ingressar no futebol alemão, sem sucesso. E após uma passagem pelo náutico, onde disputou o nacional do ano passado, foi liberado pelo Inter. Mês passado, em uma mesa de boteco de São Paulo um amigo me recordou da existência deste jogador, ora esquecido nos gramados do nordeste, afirmando que o mesmo pairava nos campos de várzea do entorno de Porto Alegre. Vencido pela maldição do extra-campo, Roger se viu obrigado a postergar, ou quem sabe desistir do futebol profissional.

Chega então 2008, e o Celeiro não pára. Mais um guri de Pelotas percorre o caminho traçado por Perivaldo, Émerson, entre outros. Advindo das escolinhas xavantes, com vinte anos, franzino e com nome americanóide, o Inter apresenta TAISON. Apenas mais um dentre centenas de milhares de guris em busca do sonho de ganhar a vida correndo atrás da bola. "– O guri é bom, pena que não sabe chutar." Diziam alguns.

"– Que nada, tem potencial para ser o novo Tinga." Retrucavam outros.

E assim, entre mais um ciscador e o novo Tinga o guri foi galgando seu espaço em meio aos medalhões colorados. Fernandão, Alex, Nilmar, Guina, e um argentino chegado depois, de nome esquisito, que tornou-se um dos seus melhores amigos. D’Alessandro, que entre outros ensinamentos, deu dicas como aprender a marcar e não ficar brabo nunca (imagino a cena do D’ale dizendo isso). Taison certamente inspirou-se no já ídolo portenho, sonhando o mesmo sonho do outro garoto aquele, também negro, também de família humilde, vencido, ainda que temporariamente, pela maldição do extra-campo. Taison não. O garoto comedor de orelhas venceu a fase do "quase". A fé não move montanhas, desculpem. Paciência não é o elixir capaz de resolver todos os problemas. Taison é hoje o que Roger poderia ter sido, mas não foi. O garoto da zona sul do estado agarrou sua chance. O tempo nem sempre é o melhor dos remédios, tampouco a paciência é a cura para todos os males. Não me agrada este discurso conformista. Frase pronta por frase pronta eu ataco pela ponta direita de Chico Buarque na veia: "Aja duas vezes antes de pensar". Taison, conhecedor de seus problemas, batalha as suas soluções. A sua fé pode servir como combustível, mas ela não move montanhas coisa nenhuma, desculpem, sou cético. A sua fé não chuta da entrada da área, não coloca de "chapa" no canto do goleiro, não dribla três zagueiros antes de guardar a pelota nas redes. O que faz isso é o treinamento.

E assim, enquanto não alcança o patamar de um Romário, o garoto de pelotas segue treinando, indiferente às dificuldades, aprimora o seu ganha pão, percorrendo o campo inteiro, na correria dos loucos, loucos desconfiados do destino, crentes apenas em si mesmos, em sua capacidade, abnegação e perseverança. Taison é hoje o que ele buscou. Deslumbrado por ser, nada mais que o artilheiro do campeonato, com cinco gols nos últimos três jogos. Eu, pseudo-cronista e colorado, só posso lhe agradecer por não ter permitido que seu medo o tenha impedido de tentar, que a rotina de jogar num clube da grandeza do Sport Club Internacional não o tenha acomodado, que ele tenha utilizado seu tempo mais fazendo do que planejando.

Obrigado!

Saudações Coloradas...

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