terça-feira, 7 de abril de 2009

QUARENTA ANOS, BEIRA-RIO

Por Daniel Ricci Araújo

Tempo que passa, tempo que volta. Poppe, Seferin, Rua Arlindo. Antenor Lemos. Gente nossa. Papel picado, gol, festa. Imitando crioulo, hein? Vicente Rao, Villalba, Carlitos. Eucaliptos. Rolo, Rolinho. Copa do Mundo, o tempo passa: ficou pequeno. O Gigante é pra já! Que nada, bóia cativa. Torcida pra pedreiro, lembra? Meu nome é Paulo Roberto e vim doar dez tijolos. Como é lindo. Vai surgindo, vai surgindo. Que concreto todo é esse, que nasceu de dentro d'água?

Seu Borda. Stechman, Ruy Tedesco. Pedra fundamental. Bóia cativa: vão rindo, vão rindo... O Gigante vai tomando forma, interminável, imenso. De pé. Um colosso! Inveja pinga pelo ar. Bóia cativa? Chorem, chorem bastante agora. Olha o sol, tá que arde na rua. Pai, vamos pela rampa? Aquele lá é o Eusébio, filho. Gol. Golaço! Gilson Porto. Quando tem jogo de novo, pai? Tempo que passa, tempo que volta – e voa.

Goleira do placar, um sufoco. Voa, Manga. Nelinho, que patada - a bola ziguezagueia, parece uma abelhinha solta, haja goleiro pra pegar. Voa, Manga! Gol de cabeça, Figueroa. Raio de sol. Cruza, Valdomiro. Lá vem ela, raio de sol: santos lugares, esses todos. O mito cabeceia. Capitão dos Andes. A área é minha casa, só entre nela quem eu quiser. Raul, paradinho. Parece até o Guaíba que ruge, quanto barulho. Goleira do placar, aquela ali, ó. Figueroa. É campeão do Brasil!

Falcão, Escurinho, Falcão, Escurinho. Pimba, pimba, pimba, quarenta e seis do segundo: obra-prima. A maior torcida do Rio Grande: eu vi tudo de lá da aba, lá de cima. Só de cabeça, pá, pum, bicampeão. Setenta e seis. Era um silêncio, e do nada o Guaíba como que fazia eco no meio da gritaria. Esse rio é colorado, já dizia meu pai. Invasão corintiana? Conta outra: aqui quem manda é o Inter. Falta cobrada, no poste e na linha, gol, bola picando, paulistinha. Goleira do Gigantinho. Final: pá e pum, bicampeão. Eu vi tudo, lá da aba. Tempo que passa, tempo que volta – e voa.

Tá difícil a coisa. Um a zero pra eles, um a menos. Não, Casemiro. Deu uma sarrafada no cara, ali na frente da inferior. Não, Casemiro! E agora? Abel, o Odone tá tomando champanha no vestiário, diz ele que já era. Vai Maurício, vai Edu, vai Nílson. Vocês viram esse jogo e isso aqui vem abaixo. Dá um bago pra dentro d'área, Maurício, que eles estão apavorados. Dá um bago. Gol! Gol! Gol do Nílson! Imitando Sassá Mutema, lembra? Gol do século, desse e do próximo. Gre-Nal do século! Bóia cativa? Chora, chora. Como é lindo!

Pinga, quarenta e dois do segundo. No meio do gol ele não fica. Fecha o olho e bate. Peguei mascado na bola, no meio do gol – ali ele não ficava. É campeão! Vai, Fabiano. Dispara. Uma bomba, chutaço, busca Danrlei! Vai Renteria, encobre o goleiro. A bola, suspensa, anda, plana, voa. Nem as barras da Popular se mexem. O goleiro da LDU só olha. Bola quica, vai sair. Que nada! Entrou, dois a zero. A América vai ser vermelha, anota aí. Até o Guaíba já sabe.

Vai, Fernandão. Jorge Wagner, bate no Ceni que a bola tá molhada. Soltou, é agora. Carrinho nela. América Vermelha! Capitão América. Que pressão. Mais um escanteio? E esse juiz que não termina o jogo. Ô, seu juiz? Acabou! Olha a taça, vai pra história, que maravilha. Libertadores! Ninguém vai embora do estádio, quanta emoção! Portão 8, lembra? Gol do Dunga, aos trinta e seis, lembra? Um dia essa sorte mudava. Viu filho, como valeu a pena esperar?

O pessoal foi pra Goethe bem cedo, eu não quis. Quando o Gabiru fez o gol, já vim pra cá, nem me preocupei. Era nosso, ninguém tasca. Tava escrito há mil anos. Eu tinha que vir pra cá, entende? Portão 8, lembra? E esse calor todo agora, eles vêm na passeata, Beira-Rio lotado num dia de semana? Ali na frente da social, Fernandão sem camisa, alucinado: "ôôô, vamo vamo Inter". Que loucura. É assim que se toca os céus com a mão, pai? É, filho. E aqui, na nossa casa, que coisa linda.

D'Alessandro. Chuta, Nilmar. Golaço. Campeão de tudo, e pra sempre. Gigante pra Sempre. Vô, quando foi tua primeira vez no Beira-Rio? Tem coisa melhor que vir no Beira-Rio em dia de jogo, vô? Não, não tem. Crianças: como perguntam! Foi ali o gol do Figueroa, né vô? Foi dali que o Librelato encaçapou aquela bucha, né vô? Santas perguntas. Que concreto todo é esse, que nasceu de dentro d'água? É o Beira-Rio, guri. Quarenta anos aqui dentro, não é pra qualquer um.


Tempo que passa, tempo que volta.

E voa.

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