terça-feira, 23 de junho de 2009

Futebol (ainda) é feito de craques.

Por Marcelo Benvenutti


Se futebol fosse realmente um esporte coletivo, somente coletivo, como os treinadores gostam de pregar em seus discursos professorais nas entrevistas coletivas, de nada serviria um time mediano contratar um craque. Sim, para que serve um craque em um time que é formado por jogadores que se esforçam para chamar a bola de "meu bem"? O craque não chama a bola de "meu bem". A bola é que se aconchega em seus pés e o chama de "querido". O craque só no andar já tem um jeito diferente. O craque não caminha, flutua.

O craque pode ser mau-caráter. Pode ser marrento. O craque pode, até mesmo, ser simpático. Mas todo time que realmente se diz vencedor necessita de um craque. Todo time de um grande clube necessita dele. As grandes seleções, as inesquecíveis, eram grupos que tinham, no mínimo, um craque.

A Hungria de 54, com Puskas. O Brasil de 58, com Didi, Pelé, Garrincha e outros. A Holanda de Cruyff. A Argentina de Maradona. O Flamengo de Zico, Fluminense de Rivelino, Corinthians de Sócrates, São Paulo de Raí, Vasco da Gama de Edmundo. Times vencedores. Ou que jamais serão esquecidos. Muitas vezes não jogavam tudo aquilo. Não apresentavam um futebol vistoso. Mas mesmo nessas horas deixavam o gramado molhado de suor. Sim, porque os craques estavam ali, servindo, auxiliando, brilhando.

Não existem prioridades. A prioridade do time de craques é vencer. Vencer e dar espetáculo. Dar espetáculo e brilhar para sempre, como uma verdadeira estrela brilhante, que vibra e cintila no céu sem precisar ser comprada no atacado da Nasa.

Em 2009 nos acostumamos a ver o Internacional vencedor. O Rolo Compressor. Avassalador. O Inter tem grupo, pregava a direção. Muitos de nós acreditamos. Sim, se entrar um boneco de posto em campo com a camiseta do Inter, venceremos. As vitórias se acumulavam e nós vibrávamos. Por quê? Porque além de vencer, vencer dando espetáculo é o sonho de qualquer torcedor. Quem não sonha ver seu time do coração vencer dando show é porque não gosta de futebol ou sofre de sérias patologias. Insano. Mas o time perfeito, o jogo ideal, vinha nos visitar. Goleadas. Cinco, seis, oito gols, quanto mais, melhor. Mas não só por isso. Porque cada jogada era um desenho nas nossas mentes. Cada gol vinha depois de uma sinfonia de acordes individuais extremamente bem executados. Cada coadjuvante se aproximando dos atores principais. Escalando suas limitações na exorbitância do futebol dito coletivo. Ledo engano. Lerdo engano. O futebol é, sim, feito de individualidades.

Assim era o Inter de Nilmar, D'Alessandro e Taison. Parte da torcida criticava Nilmar. Mercenário. Fresco. Outros adjetivos que aqui não vou enumerar. D'Alessandro não dá entrevistas. Os repórteres não gostam dele. As mães não gostam dele. O Papai Noel, o coelhinho da Páscoa e o Lasier Martins não gostam dele. D'Alessandro é o mal em pessoa. Taison fala demais. Fala bobagens. Taison é um guri. Taison "vai matá Sandrinha". Mas tirem D'Alessandro, Taison e Nilmar do Internacional e o que restará é o coletivo. No coletivo sobram a garra e a vontade de um extraterrestre, Guiñazu, mas que não é um craque. A bola não chama o Guiña de querido. A bola obedece El Cholo. Se ela não obedecer, problema dela. Lauro nos salva de bolas impossíveis e não engole perus imemoriais. Mas o trio acima, o trio de craques, pois Taison pra mim é craque, não só chama a bola de querida, como a carrega pra casa, deita na cama e dá beijo de boa noite de língua. E quando os craques somem e nos resta o coletivo, sobra a vontade.

O Inter não entrou em campo contra o Flamengo. Não. Não tivemos vontade, fomos covardes e patéticos. Não jogamos nada e não fizemos por merecer nada menos que um quatro a zero. Ficou de bom tamanho. O líder do campeonato se distancia treinado por um mau humorado acostumado a treinar equipes medíocres. Os medíocres até podem ser campeões, quando se esforçam além do limite e o campeonato é curto. No longo prazo restam os craques. Nas páginas de história sobrevivem os grandes times. Os excepcionais.

Os loucos. Gênios. O Inter de domingo passado não ficará para a história. Nem jogará o resto do campeonato. Cabe a direção nos garantir que os craques voltarão. Porque, sem craques, nem Guiñazu vai convencer os outros jogadores colorados que, coadjuvantes que são, irão nos salvar do naufrágio. Guiñazu nadará sozinho.

Assim como nadou no Maracanã.

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