quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Por un Cabezón.

Por Marcelo Benvenutti


Em 1935, Carlos Gardel e Alfredo Le Pera produziram uma obra-prima do tango chamada “Por una Cabeza”. A maioria de vocês deve conhecer por ser a cena de dança do Al Pacino cego com a Gabrielle Anwar no filme Perfume de Mulher. Entre a melodia reconhecível em qualquer tempo e espaço e a cadência de seus altos e baixos, a letra vai nos contando sobre um sujeito viciado em apostar em cavalos de corridas que parecem vencedores, que também costuma se apaixonar por mulheres que parecem ser de boa índole.

No primeiro tempo, amarrados pelo Atlético do Roth, os colorados enxergaram o fantasma da impotência se aproximando novamente do Beira-Rio. Contra-ataques rápidos e más pontarias quase nos tiram a virgindade nos primeiros 45 minutos. Renteria, nosso eterno Saci, quis fazer um de seus típicos golaços, intercalados sempre com algumas tosquices próprias do dançarino de ruque-raque. Por uma cabeça, Renteria não fez. Por outra, Tardelli não acertou o gol de Lauro. A torcida, apreensiva, não sabia em quem apostar. A bela mulher de domingo se aproximava das maiores vadias da parada. Um tango trágico e patético se desenhava sob os holofotes do Gigante.

No intervalo, sabe-se lá como, e nem me interessa saber, Tite mudou. Tite mudou o esquema. Tite tirou Danilo e mandou D'Alessandro entrar em campo. Preencheu o espaço que faltava no meio campo e soltou as rédeas do gringo. Apostou no cavalo nobre. Por una cabeza de un noble potrillo, canta Gardel de sua tumba no cemitério de La Chacarita em Buenos Aires. Por uma cabeça, Tite apostou. Como o apaixonado que não esquece o beijo e o sorriso daquela mulher, mesmo que depois ela acabe o traindo, o enganando com um outro qualquer, como bem escreveria o compositor do hino deles, a quem humildemente também admiro. Tite não teve medo de ser feliz. E como é bom não ter medo, Tite. Como é bom!

O nosso cavalo de raça, de paraguaio não tem nada, entrou e simplesmente aniquilou com o Atlético. O Galo virou uma galinha depenada e sem cabeça. Os pintos fugiram pra baixo da asa do morcego. Dentro daquela galinha não saía mais ovo. D'Alessandro disparou, rodeou, driblou, lançou, chutou e vibrou. Kleber, como um Mustang selvagem, ignorou as porteiras da defesa mineira e deixou duas vezes Edu à vontade para, de novo, por uma cabeça, nos colocar mais à frente. À frente de quase todos.

Tite, tal qual Gardel, cantarola sozinho, em seu carro, dando voltas na Beira-Rio: Cuantos desengaños, por una cabeza, yo jure mil veces no vuelvo a insistir, pero si un mirar me hiere al pasar, su boca de fuego, otra vez, quiero besar. Sim, ele está feliz. Apostou. Apostou como os grandes, tanto nas derrotas quanto nas vitórias, devem apostar. Apostou e venceu. E continuará vencendo. Basta acreditar, mesmo que tudo diga o contrário. Mesmo que o cavalo vencedor tenha nos enganado em outro domingo no prado. Um cavalo de raça sempre é uma esperança. É melhor perder-se por aquella coqueta y risueña mujer , que al jurar sonriendo, el amor que esta mintiendo quema en una hoguera todo mi querer, do que viver enfastiado junto a um par burocrático.

Venceremos, Tite. Venceremos este campeonato disputado, ponto a ponto. Não será fácil, mas venceremos. Por un Cabezón.

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