sexta-feira, 2 de outubro de 2009

É preciso ser tricolor.

Por Marcelo Benvenutti


O Internacional palavreia aos quatro cantos seus feitos de marketing. No jargão do povo da Publicidade, Relações Públicas, Administração, etc. o Internacional é um case. Sim. Um clube falido, as portas abertas do cofre onde nem as aranhas faziam teias pois não tinham moscas ou algo para roer. Um grande clube abandonado por sucessivas e fracassadas direções que tratavam a torcida como lixo biodegradável, sem reciclagem, direto no esgoto.

Sim, o Inter que era o Atlético Mineiro de dez anos atrás não existe mais. Temos que dizer, sim, que muito foi feito nestas oito temporadas de gestão Fernando Carvalho & Cia. Não podemos negar. Certa vez, numa entrevista, o líder máximo declarava como sofria ao ver o Inter perder campeonato atrás de campeonato, envergonhado, jogado nas últimas colocações da tabela, virando parceria do Botafogo e do Náutico. Queria, antes de tudo, que o Inter lutasse para vencer. Tenho que admitir que muitas das equipes sofríveis daqueles anos difíceis eram realmente formadas por jogadores de qualidade técnica duvidosa, para não ofender os mais sensíveis. Muitas vezes eram jogadores de segunda linha, do terceiro escalão do futebol nacional, quando aparecia um Caíco era um girassol numa floresta ervas daninhas. Era a estrela. Mas, garanto, nenhum colorado era menos colorado porque sofria, torcia, vaiava ou lotava o estádio depois de, improváveis três vitórias seguidas. O colorado era, antes de tudo, parafraseando Euclides da Cunha, um forte. E nada o derrubava.

Foi desse torcedor, que sofreu, que sobreviveu, que atravessou por quarenta anos o deserto até a terra prometida que nasceu o grupo que hoje domina o Inter. Foi do desejo desse torcedor que o Inter renasceu para as vitórias, para as primeiras posições da tabela, para o respeito dos adversários e pelo temor dos inimigos. Antes de tudo, foi do torcedor, sempre ele, que nasceu a Libertadores, o Mundial e o Centenário festejado como nunca outra torcida do Brasil festejou, nas ruas, com as bandeiras largas, extensas, cobrindo as ruas de Porto Alegre e de todos os lugares onde existisse um colorado. Onde existe um colorado, existe esse desejo. O de resistir. Foi resistindo aos tempos amargos que ele ficou forte.

Então tudo, depois de consumado, se transformou em um caso de marketing. Um reflexo da administração moderna, da auto-ajuda, do Lair Ribeiro, do Evandro Motta e, se duvidar, até do Bispo Macedo. Afinal, o que seria o mundo sem o Marketing? O livro mais famoso do mundo é puro marketing. "Afasta de mim este cálice"? Marketing. "Nunca tantos deveram tanto a tão poucos"? Marketing. "Eu tive um um sonho"? Óbvio que é marketing. Tudo é marketing. Tem cara que ganha dinheiro só dizendo pros outros como eles devem fazer para ganhar dinheiro. Outros ganham só para responder o óbvio e ainda são aplaudidos para tanto. Tudo se resolve numa boa campanha, em alguns releases repetidos por jornalistas preguiçosos e a fama está feita. Deite-se e deleite-se. É assim, não é?

O Internacional dos anos 2000 é assim. Ganhou títulos importantes. Ganhou respeito e babação de ovo generalizada. É admirável que gastem páginas de editoriais e se veiculem campanhas institucionais a rodo por rádio, tevê e internet. A torcida compra. A torcida consome. Paga. Mas quando o produto não corresponde, óbvio que o consumi ... quer dizer, torcedor, reclama. Tem direitos adquiridos como qualquer consumidor. Não vai devolver o produto pois o que ele consome vem de dentro. É paixão. É irracional. Assim como muitos outros produtos que nos empurram goela abaixo. No caso do futebol o intangível torna-se tangível quando os onze adentram o gramado e o sujeitinho de preto (ou outras cores extravagantes) trila o apito e dá início ao combate. Ali a paixão torna-se concreta. Ali não existe marketing. O que é, é. Não adianta contratar publicitário, motivador ou advogado de defesa. Ninguém pode nos dizer que o rei não está nu. Está nu e com o rabo sujo.

O futebol apresentado pelo Inter, que é o que realmente interessa, e as vitórias são consequências disso, nos últimos tempos é sofrível. Pior, é vergonhoso. Não que sejamos um Real Madrid. Não. Ninguém no Brasil é um Real Madrid. Mas também não somos a Campinense. Estamos em quarto lugar no Brasileirão por inércia. Nas quatro primeiras rodadas, quando jogaram os reservas, marcamos 12 pontos. Nas outras, 32 pontos em 22 jogos. Aproveitamento de 50%. Bem longe do discurso de 66%. O futebol dentro de campo, o dos discursos, organizado, participativo, incisivo, com equilíbrio e quantos mais eufemismos eles criem, é feio, desorganizado e jogado ao imponderável das individualidades. Domingo, abaixo de chuva, doze mil náufragos foram tentar torcer pelo Inter. Alguns, acredito que muitos, vaiaram. Fernando Carvalho mais uma vez declarou que aqueles que quiserem vaiar, que fiquem em casa. Faixas criticando a atual situação foram venezuelamente recolhidas pelas forças de segurança. A atual direção parece começar a sofrer a maldição de Darth Vader. “O medo é o caminho para o lado negro. O medo leva à raiva, a raiva ao ódio e o ódio leva ao sofrimento!” Claro que a culpa é da torcida! Injusta e esfomeada. Querem vaiar? Que comam brioches!

Mas o estertor da coluna de hoje, que poderia ser o resumo de todo o resto, brilha no dourado da camiseta comemorativa. Deixo minha contribuição ao departamento de marketing colorado. Garanto que com esta frase garantiremos mais algumas semanas para que Tite procure o "ponto de equilíbrio" junto a um professor de Geometria Espacial que a direção contratou.

"NÃO BASTA SOMENTE PERDER. É PRECISO SER TRICOLOR."

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