quarta-feira, 25 de novembro de 2009

O Inter sendo o Inter.

Por Daniel Ricci Araújo

Meus amigos, que maravilha!

Muitas vezes, os jogadores e dirigentes subestimam a experiência do torcedor no futebol. “O torcedor é passional”, bradam alguns. “Injusto”, falam outros. “A arquibancada só vê o lado ruim da coisa”, ainda completam certos arautos. Vamos e venhamos: que sacrilégio. Mesmo com seus defeitos endêmicos, com sua visão de apaixonado delirante, o torcedor é o rei do espetáculo. Mais do que ver, ele dramatiza o jogo e sente-o como uma fratura exposta, ainda mais quando está à frente de uma partida decisiva como a do último domingo, no Mineirão.

Fato: durante uma parte do campeonato, o Inter vinha jogando miseravelmente sem ser o Inter. Perdemos certas partidas por adotar a postura de um time medroso, manhoso, acabrunhado, mais cheio de pudores do que um colegial ardendo de puberdade ao encarar a vizinha pela fresta da janela. Era terrível: o Inter vinha num medo convulsivo de ser feliz. Mesmo quando ganhava ou empatava, tinha ares de uma acomodação interminável. Até que um dia, do nada, no momento mais necessário do campeonato, a letargia some, ou melhor: a letargia vai plantar batatas na esquina.

Chega o momento de ir ao Mineirão lotado para praticamente decidir uma vaga à Libertadores. Durante a semana a torcida expunha o medo de que o time se retraísse, se desgovernasse e periclitasse morrendo à míngua na grama alta das alterosas mineiras. O próprio Mário Sérgio falava em jogar na defesa. Mas então se inicia o primeiro tempo, e o blefe monumental está maravilhosamente configurado: o Inter vai à frente, toca a bola no campo do Atlético, comporta-se claramente como o time dono das ações, que joga e faz jogar. Qualquer leigo, ao assistir aquele primeiros lances esparsos, diria sem hesitar: o time de vermelho é o melhor. Até que enfim, habemus equipe: o Inter estava sendo o Inter de novo.

Conduzido por Guiñazu, Sandro, D’Alessandro e Giuliano (que quarteto!, que quarteto!), o Colorado vence o jogo, dita ritmo e dá cátedra. Temos uma equipe claramente superior em campo: não há torcedor colorado que, agora, não enxergue isso e aplauda o time. Naquele momento, o torcedor indignado com a covardia de outros momentos está seguro: o Colorado repetia contra o Galo uma atuação muito parecida a da derrota injusta contra o São Paulo – e por falar nisso, já naquele tremendo azar no Morumbi o time fora mais aplaudido do que em muitas outras vitórias duvidosas.

O Atlético-MG está empurrado por uma massa fanática e interminável, e pressiona: o Inter mantém-se seguro e continua com a bola. Não há a menor dúvida de que, nas arquibancadas lotadas do Mineirão, todos sentem a enrascada na qual se metera o time da casa. Grande Inter! Inter de força, de tradição, Inter de calar grandes estádios em jogos decisivos e de grandes consagrações, como a de anteontem! Joguem fora as pranchetas: o futebol da arquibancada é um jogo empírico e emocional. E esse é o time o qual a torcida quer ver e ter de volta.

Os analistas talvez dirão o seguinte: Mário Sérgio teve uma recaída e mexeu errado ao tirar D’Alessandro, e com isso condenou o time a muitas dificuldades no segundo tempo. Estão certos, penso eu. Mas na dificuldade do jogo ainda mais sobressaltada, aí o Inter pode ensaiar uma ponta da consistência defensiva que se espera dos projetos de grandes equipes. Abaixo o mais do mesmo, a retranca feia, insossa e manca praticada por mais de metade do campeonato como medíocre filosofia de vida!

Atrapalhado pelo equívoco do comandante, o Inter teve então a brecha para tornar-se heróico. Há bicos e bicos na bola - a torcida, que sente o jogo, sabe disso. E depois de terminado o sufoco, nunca se vira um acidental ferrolho ao Deus-dará ser tão saudado numa segunda feira adentro como estratégia perfeita e acabada. Vencedor da partida improvável e terminal, o Inter fora de novo o Inter. Meus caros, eis a verdade: o torcedor conhece o jogo e aplaude o que viu.

É isso é tudo o que ele precisa saber.

Nenhum comentário: